A banda britânica Coldplay nunca escondeu o objetivo de levar o seu rock intimista a ares cada vez mais grandiosos e universais. Chris Martin e sua trupe usaram o melhor das influências de U2 e britpop no início dos anos 2000, e então mergulharam no pop quase eletrônico em seus trabalhos recentes. Agora, o quarteto entrega seu oitavo álbum “Everyday Life” (2019), o qual retoma uma sonoridade orgânica e retrô, mas sem deixar de ir além...
Aqui, temos as partes “Sunrise” e “Sunset”, indo do rock alternativo eletroacústico ao experimentalismo, e amarrando diversidade de voz e arranjos a um grande acervo de temáticas: humanidade, união, pluralidade espiritual, e críticas ácidas à guerra e às políticas excludentes. A velha melancolia também voltou em parte, ainda que a esperança fale mais alto.
A razoável faixa “Church” é um dream pop que já abre o disco com espaço para influências culturais do oriente médio. Esse sutil fundo de ‘world music’ também está presente na ótima “Orphans”, um pop/rock alegre e tribal com pitadinhas de Paul Simon, porém corajoso em sua séria letra sobre refugiados da Síria. A ousadia sônica atinge o ápice na excelente, densa e cinemática “Arabesque”, uma espécie de fusion exótico que abusa de um arranjo de metais enquanto dispara uma mensagem política que deixaria o Roger Waters orgulhoso.
Voltando ao lado ocidental, destaco o gospel “BrokEn”, de uma rusticidade bastante simpática. Já “Daddy” é uma balada lúdica ao piano com capacidade de nos arrancar algumas lágrimas, o que a torna uma das melhores do álbum! A quase progressiva “Trouble in Town” aborda o racismo, com uma construção que vai da serenidade soturna a um arrepiante ponto de tensão. E no folk "Guns", Martin soa como um Dave Matthews irritado, ao criticar o armamentismo.
Como nem tudo são flores, devo citar a leve inconstância da parte “Sunset”, pois cai às vezes no mero exercício de ecletismo. E ainda temos faixas fracas como “When I Need a Friend”, que parece um coral no culto de uma religião picareta, enquanto que a balada básica “Champion of the World” usa uma ‘vibe’ meio Echo & the Bunnymen para ser apenas campeã da sonolência.
Pode-se sintetizar o álbum “Everyday Life” através de sua boa faixa-título, uma canção sinfônica que não apenas indica a volta do Coldplay ao universo do rock alternativo diversificado, como também faz ligação com “Everybody Hurts” (do R.E.M.) e com todo o conceito de empatia estabelecido no disco. E assim se encerra uma jornada que, mesmo tendo imperfeições, lembra a essência artística do “Viva La Vida” (2008), e supera as obras lançadas pelos caras desde então. Aqui, há um sentimento sincero e realista: todo dia é incrível, e todo dia é terrível.
Nota: 8
Por Fábio Cavalcanti
Músicas:
1. Sunrise
2. Church
3. Trouble in Town
4. BrokEn
5. Daddy
6. WOTW / POTP
7. Arabesque
8. When I Need a Friend
9. Guns
10. Orphans
11. Èkó
12. Cry Cry Cry
13. Old Friends
14. (Son Of Adam)
15. Champion of the World
16. Everyday Life
Aqui, temos as partes “Sunrise” e “Sunset”, indo do rock alternativo eletroacústico ao experimentalismo, e amarrando diversidade de voz e arranjos a um grande acervo de temáticas: humanidade, união, pluralidade espiritual, e críticas ácidas à guerra e às políticas excludentes. A velha melancolia também voltou em parte, ainda que a esperança fale mais alto.
A razoável faixa “Church” é um dream pop que já abre o disco com espaço para influências culturais do oriente médio. Esse sutil fundo de ‘world music’ também está presente na ótima “Orphans”, um pop/rock alegre e tribal com pitadinhas de Paul Simon, porém corajoso em sua séria letra sobre refugiados da Síria. A ousadia sônica atinge o ápice na excelente, densa e cinemática “Arabesque”, uma espécie de fusion exótico que abusa de um arranjo de metais enquanto dispara uma mensagem política que deixaria o Roger Waters orgulhoso.
Voltando ao lado ocidental, destaco o gospel “BrokEn”, de uma rusticidade bastante simpática. Já “Daddy” é uma balada lúdica ao piano com capacidade de nos arrancar algumas lágrimas, o que a torna uma das melhores do álbum! A quase progressiva “Trouble in Town” aborda o racismo, com uma construção que vai da serenidade soturna a um arrepiante ponto de tensão. E no folk "Guns", Martin soa como um Dave Matthews irritado, ao criticar o armamentismo.
Como nem tudo são flores, devo citar a leve inconstância da parte “Sunset”, pois cai às vezes no mero exercício de ecletismo. E ainda temos faixas fracas como “When I Need a Friend”, que parece um coral no culto de uma religião picareta, enquanto que a balada básica “Champion of the World” usa uma ‘vibe’ meio Echo & the Bunnymen para ser apenas campeã da sonolência.
Pode-se sintetizar o álbum “Everyday Life” através de sua boa faixa-título, uma canção sinfônica que não apenas indica a volta do Coldplay ao universo do rock alternativo diversificado, como também faz ligação com “Everybody Hurts” (do R.E.M.) e com todo o conceito de empatia estabelecido no disco. E assim se encerra uma jornada que, mesmo tendo imperfeições, lembra a essência artística do “Viva La Vida” (2008), e supera as obras lançadas pelos caras desde então. Aqui, há um sentimento sincero e realista: todo dia é incrível, e todo dia é terrível.
Nota: 8
Por Fábio Cavalcanti
Músicas:
1. Sunrise
2. Church
3. Trouble in Town
4. BrokEn
5. Daddy
6. WOTW / POTP
7. Arabesque
8. When I Need a Friend
9. Guns
10. Orphans
11. Èkó
12. Cry Cry Cry
13. Old Friends
14. (Son Of Adam)
15. Champion of the World
16. Everyday Life