28 de junho de 2019

Resenha: "THE BLACK KEYS - LET'S ROCK" (2019)


O The Black Keys é um duo norte-americano que surgiu no início da década passada, e que conquistou algum sucesso comercial entre 2008 e 2014 (lembram de "Tighten Up" e "Lonely Boy"?), bem no início do período de “vacas magras” que ainda prejudica o rock como um todo. Após um hiato de cinco anos, eis que Dan Auerbach (voz, guitarra) e Patrick Carney (bateria) retornam com um álbum de rock “garageiro” focado na tríade voz-guitarra-bateria, e que surpreende pelo desapego a qualquer necessidade de modernização: “Let's Rock” (2019).

A faixa de abertura “Shine a Little Light” já manda o tom do disco, ao trazer um ritmo pulsante, guitarras “crocantes”, e letras que apontam uma necessidade de encontrar alguma luz no fim do túnel - algo que contrasta sutilmente com as temáticas um tanto pessimistas da maioria das suas antigas canções. O rock ‘n’ roll quase sessentista “Eagle Birds” remete ao espírito ‘upbeat’ do excelente álbum “El Camino” (de 2011), e exemplifica outra qualidade desse novo trabalho como um todo: o vocal cada vez mais limpo e ondulante de Dan Auerbach.

O primeiro single, “Lo/Hi”, soa como um ZZ Top ‘indie’, e nos coloca diretamente ao volante de um carro numa divertida e ensolarada viagem... E já que estamos falando de viagem, vale destacar também a dançante “Go”, que traz um adorável sabor “surf rock” e nos leva a pisar fundo no acelerador... E o que falar sobre o hipnótico ‘groove’ cadenciado da cínica “Tell Me Lies”?

Pode parecer, até então, que o som desse álbum é meio linear, mas a verdade é que podemos notar também alguns sutis toques de soul (já experimentados em seus três últimos trabalhos), southern rock, e do bom e velho blues. “Walk Across the Water”, por exemplo, é uma bela balada de puro ‘feeling’ em sua serenidade. E a simpática “Sit Around and Miss You” soa como uma fusão de Fleetwood Mac com Tom Petty. Por outro lado, “Breaking Down” não possui tanta coesão, e logo se torna esquecível.

Por fim, “Let's Rock” é um álbum inspirado, bem produzido na sua rusticidade, e que move o The Black Keys das sombras para um ambiente de luz e otimismo... ou, pelo menos, para uma ‘vibe’ de diversão e espontaneidade. Esse é um disco absurdamente necessário nos dias atuais, e que concede um passeio de 39 minutos pelo melhor de um rock ‘n’ roll que mistura bem os timbres ásperos com vocais relativamente tranquilos. Como eles mesmos diriam no excelente country rock “Get Yourself Together”: tente ficar numa boa...

Nota: 9

Por Fábio Cavalcanti

Músicas:
1. Shine a Little Light
2. Eagle Birds
3. Lo/Hi
4. Walk Across the Water
5. Tell Me Lies
6. Every Little Thing
7. Get Yourself Together
8. Sit Around and Miss You
9. Go
10. Breaking Down
11. Under the Gun
12. Fire Walk with Me

26 de junho de 2019

Resenha: "ANNABELLE 3: DE VOLTA PARA CASA" (2019) [sem spoilers]


O enorme sucesso dos dois filmes de “Invocação do Mal” foi mais do que o bastante para que se estabelecesse um “universo expandido” dessa saga de suspense, a qual conta agora com a recém finalizada (será?) trilogia de Annabelle, a demoníaca boneca que já havia conquistado aquele pequeno capiroto que existe dentro de todos nós. Porém, esse “Annabelle 3: De Volta Para Casa” (2019) empalidece e cai no genérico, se comparado em especial ao segundo filme do seu próprio segmento...

Cronologicamente, a história começa após o primeiro “Invocação”, quando os demonologistas Ed Warren (Patrick Wilson) e Lorraine Warren (Vera Farmiga) tentam manter a boneca Annabelle trancada em seu porão... até que um grupo de jovens acaba liberando sua maldição mais uma vez. De novidade, temos novos espíritos que nenhum de nós pediu (mais filmes derivados em vista?), e que não assustam tanto quanto os já apresentados anteriormente. E o casal, ironicamente, sai de cena bem antes de a história começar a ficar medíocre...

O diretor Gary Dauberman inicia a narrativa de forma acertada em seu diferencial, com um tom sutil e quase intimista, em que somos gradativamente apresentados às jovens que são as verdadeiras protagonistas da vez: Judy Warren (Mckenna Grace), Mary Ellen (Madison Iseman) e Katie Sarife (Daniela Rios). Além de serem personagens divertidas, elas são o ponto central da união entre o velho suspense de “casa assombrada” e questões sobre amadurecimento durante uma situação de terror claustrofóbico.

Porém, a partir de determinado momento, Dauberman começa a “empilhar” suas ininterruptas sequências de terror, algo que não apenas muda o tom do filme, como também consegue transformá-lo num barulhento circo – e sim, esse “espetáculo” provoca risos, em meio a uns sustos bem bacanas. Há certa habilidade técnica do diretor, como em algumas empolgantes cenas que usam bons jogos de reflexo ou iluminação. Mas, seus acertos não tiram o nosso desprazer de ver até as protagonistas tomando algumas decisões previsíveis e estúpidas...

Com erros e acertos, “Annabelle 3: De Volta Para Casa” não é um filme ruim... tampouco bom. Ainda existe apreço dos produtores pelo suspense que destaca o elemento humano, logo esse “universo invocado” ainda não está totalmente gasto. Mesmo assim, há uma pergunta esperta que foi colocada aos Warren no início desse filme: “será que não é melhor destruir a boneca de uma vez?”. E a resposta deles diz tudo sobre a demanda comercial que ainda existe por essa franquia: “se destruir, o efeito é pior”. Pois então, a “Invocação da Grana” continua...

Nota: 5

Por Fábio Cavalcanti

21 de junho de 2019

Resenha: "THE RACONTEURS - HELP US STRANGER" (2019)


Se você não esteve totalmente alheio ao rock nos últimos 20 anos, deve ter ouvido falar em um músico inquieto chamado Jack White. O cantor/guitarrista atingiu o sucesso através do duo The White Stripes, e então se aventurou em mais três projetos distintos – incluindo sua carreira solo. Um desses projetos é o The Raconteurs, banda norte-americana formada também por Brendan Benson (voz e guitarra), Jack Lawrence (baixo) e Patrick Keeler (bateria). Após um longo hiato do grupo em questão, temos agora o seu terceiro álbum: “Help Us Stranger” (2019).

Apesar de possuir uma carreira solo “aventureira” em termos de estilos, White aproveitou o The Raconteurs para voltar a tocar um rock “old school” mais coletivo. Assim como nos dois álbuns anteriores, o novo trabalho conta com influências que vão do blues rock ao folk, e ainda fornece letras simples e objetivas sobre a vida, que unem sensibilidade e irreverência. A faixa que melhor representa o espírito do álbum é justamente a ensolarada “Help Me Stranger”, a qual mistura bem o acústico, o elétrico, a serenidade e uma pegada suingada, tudo ao mesmo tempo...

Vale lembrar que, mesmo com a sua abordagem despretensiosa, há um nível bacana de refinamento por parte das vozes – incluindo o Benson - e instrumentais, além de pequenas mudanças rítmicas, e ganchos melódicos em várias faixas. No extremo mais roqueiro, a sensacional “Bored and Razed” é o tipo de “porrada” que pode eletrizar todo o corpo de qualquer pessoa que não esteja morta por dentro. No extremo introspectivo, contemplemos a linda - e quase flutuante - “Only Child”, além da simpática “Now That You're Gone”.

A esquisita “Don't Bother Me” é um momento quase ‘jam band’, que cativa por parecer uma combustão sônica espontânea. Já “Sunday Driver” puxa uma ‘vibe’ meio Rolling Stones, que nunca deixa de soar atraente. E “Hey Gyp (Dig the Slowness)” é um alucinado cover do Donovan que evoca o extremo mais dançante e percussivo do blues rock. Por outro lado, há algumas faixas menos inspiradas, como a simplória e 'beatlenesca' balada "Shine the Light On Me"... Sem contar “Thoughts and Prayers”, que possui um sabor “country alternativo” meio insosso...

Pode-se concluir que “Help Us Stranger” traz de volta, com sucesso, os cenários rústicos, os altos e baixos, e o “feeling retrô” desmedido que sempre adoramos na maioria dos trabalhos de Jack White - e arrisco dizer que o The Raconteurs pode vir a se tornar o seu projeto mais respeitado. Temos aqui uma banda em que todos os quatro membros se destacam de alguma forma, e que pode fornecer uma experiência deliciosa em sua sutil amplitude. Feche os olhos e escute alto!

Nota: 8

Por Fábio Cavalcanti

Músicas:
1. Bored and Razed
2. Help Me Stranger
3. Only Child
4. Don't Bother Me
5. Shine the Light On Me
6. Somedays (I Don't Feel Like Trying)
7. Hey Gyp (Dig the Slowness) [cover de Donovan]
8. Sunday Driver
9. Now That You're Gone
10. Live a Lie
11. What's Yours Is Mine
12. Thoughts and Prayers

Resenha: "HOLLYWOOD VAMPIRES - RISE" (2019)


O Hollywood Vampires é um supergrupo de hard rock estadunidense, capitaneado pelos renomados músicos Alice Cooper (vocalista) e Joe Perry (do Aerosmith, guitarrista), juntamente com o ator Johnny Depp (guitarrista). Seu primeiro álbum, lançado em 2015, foi um grande tributo colaborativo a artistas icônicos do rock – muitos já falecidos -, através de um apanhado de covers dos mesmos. Já no segundo álbum, “Rise” (2019), temos finalmente a faceta autoral dos “vampiros”, a qual traz resultados bastante satisfatórios...

Há um clima de morbidez cômica que permeia o trabalho, quase como uma suposta trilha sonora para um daqueles “filmes B” que nos deixam com um sorriso no rosto. E, como já era de se esperar, as letras possuem o habitual espírito teatral de Alice Cooper, seja ao girar em torno de algum alter ego pitoresco, ou na narrativa de situações mirabolantes.

A química entre os três líderes nem sempre se mostra tão harmoniosa, mas ainda nos garante canções inspiradas, como as arrepiantes e impositivas “Who's Laughing Now” e “New Threat”, a fantasmagórica “The Boogieman Surprise”, a quase bêbada “We Gotta Rise”, e o irreverente ‘rockabilly’ “Welcome to Bushwackers” (com um solo de guitarra bem bacana do Jeff Beck). Já “I Want My Now” se perde no seu paradoxo de ser uma canção boba e “épica” ao mesmo tempo, e a soturna balada “Mr. Spider” parece uma sobra de um dos discos conceituais de Cooper.

E para não esquecer totalmente daquele velho espírito de “homenagem”, o grupo fornece aqui três novos covers, sendo que o destaque positivo fica para a versão deliciosa e muito bem azeitada de “Heroes” (David Bowie). O destaque negativo fica para “You Can't Put Your Arms Around a Memory” (Johnny Thunders), em que Joe Perry canta como alguém que acabou de tomar rivotril.

No fim, “Rise” é um disco que, com o perdão do trocadilho, consegue elevar efetivamente o Hollywood Vampires para a sua própria identidade sonora. Ainda que essa banda não seja superior aos trampos principais de Alice Cooper e Joe Perry, pelo menos representa um “desvio” para um ambiente cheio de novas aventuras e confusões roqueiras. Se o Johnny Depp voltou a ser um garoto deslumbrado, por tocar guitarra ao lado dos seus heróis, nós também podemos embarcar nessa inocente viagem...

Nota: 7

Por Fábio Cavalcanti

Músicas:
1. I Want My Now
2. Good People Are Hard to Find [vinheta]
3. Who's Laughing Now
4. How the Glass Fell [vinheta]
5. The Boogieman Surprise
6. Welcome to Bushwackers
7. The Wrong Bandage [vinheta]
8. You Can't Put Your Arms Around a Memory [cover de Johnny Thunders]
9. Git From Round Me
10. Heroes [cover de David Bowie]
11. A Pitiful Beauty [vinheta]
12. New Threat
13. Mr. Spider
14. We Gotta Rise
15. People Who Died [cover de Jim Carroll]
16. Congratulations

12 de junho de 2019

Resenha: "MIB: HOMENS DE PRETO - INTERNACIONAL" (2019) [sem spoilers]


Em 1997, fomos presenteados com o primeiro “Homens de Preto”, uma surpreendente mistura de ficção científica, investigação e comédia, e que ainda trazia um peculiar subtexto sobre a possibilidade de termos milhares de seres alienígenas disfarçados entre nós - algo que ainda dialoga com a esquisitice cômica que nós mesmos podemos apresentar como terráqueos. Após duas sequências, temos agora “MIB: Homens de Preto - Internacional” (2019), uma obra que renova a equipe e as ambientações, mas perde boa parte do charme sarcástico da franquia.

A história amplia a agência secreta ‘MIB’ a nível internacional, sendo que agora o foco é a sua sede londrina. A nova agente M (Tessa Thompson) se junta ao H (Chris Hemsworth), e a dupla tenta descobrir um complô alienígena que envolve um traidor da própria organização. Ao longo da narrativa, eles são orientados pela agente O (Emma Thompson) e High T (Liam Neeson).

O diretor F. Gary Gray deve ter pensado, erroneamente, que seria uma boa ideia se direcionar apenas ao caráter investigativo - que funciona razoavelmente -, sem usar a ironia do primeiro filme, aquela que à época fez o espectador refletir até sobre a ignorância e a arrogância que possuímos sem nos dar conta de que somos meros “pontinhos” num vastíssimo universo...

De toda forma, a gama de alienígenas adoravelmente exagerados ainda pode encher nossos olhos - em especial o simpático Pawny, que parece ter vindo da Pixar -, à medida que alguns personagens terráqueos também possuem suas qualidades: Tessa Thompson confere um real senso de encantamento como novata daquela agência, e Chris Hemsworth consegue ser divertido na composição de um agente que se alterna entre o habilidoso e o quase pastelão. Emma Thompson e Liam Neeson também possuem seus brilhos próprios. Por outro lado, Rebecca Ferguson faz uma alienígena que parece um tanto indefinida na história.

A ação e as pequenas reviravoltas são "ok". Já a diversidade de locações parece servir apenas para nos trazer uma pitada de “Missão Impossível” para a franquia ‘MIB’... isso é, algo diferente e com algum frescor visual, porém sem real fluidez narrativa. E os vilões são tão “memoráveis” que podemos esquecer das suas presenças e motivações logo após a sessão...

Homens de Preto - Internacional” é uma tentativa irregular de ampliar o universo ‘MIB’, e que ainda desperdiça a potencial ideia de criar entrelaces efetivos com a realidade terráquea de 2019. No fim, ele não consegue ser mais do que um rasteiro e “engraçadinho” filme episódico, do tipo que até pode ser esquecido sem necessidade de que os divertidos agentes M e H utilizem um ‘neuralizador’ para apagar nossas memórias... A propósito, de qual filme falávamos mesmo?

Nota: 5

Por Fábio Cavalcanti