11 de outubro de 2019

Resenha: "EL CAMINO - UM FILME DE BREAKING BAD" [sem spoilers]



Para muita gente, Breaking Bad é uma das séries dramáticas mais criativas e intensas dos últimos anos. Porém, seu último episódio deixou uma pequena ponta solta quanto ao destino do querido personagem Jesse Pinkman (Aaron Paul), enquanto que Walter White (Bryan Cranston) e outros personagens centrais tiveram seus arcos muito bem finalizados. Tal pendência foi solucionada através do filme “El Camino” (2019), em que a história se passa logo após aquele marcante episódio.

Jesse nos é apresentado já como um fugitivo, e como alguém que deseja superar o passado e encontrar um novo caminho após ter cometido sua parcela de crimes. Assim como ocorria na série, o diretor Vince Gilligan apresenta uma narrativa crescente, sem apelações, e que transita bem entre o drama e o suspense policial. Há mensagens sobre as consequências da vida criminosa, estresse pós-traumático, e sobre a extrema dificuldade – ou impossibilidade – de retomar o controle da vida após certas situações...

Como Jesse é o centro da narrativa, há algumas falhas de condução no sentido de que todos os outros personagens se tornam episódicos – e consequentemente, esquecíveis para qualquer pessoa pouco familiarizada com a série. Aaron Paul faz uma atuação excelente em termos de angústia total, intensificada pelos bons flashbacks que nos mostram não apenas como o personagem mudou bastante ao longo de sua jornada, como também evidenciam a necessidade de uma ruptura com o seu “inocente” passado.

Gilligan ainda nos apresenta uma direção que encontra vida em meio a uma ambientação mais sombria do que de costume, e sem abrir mão de suas rimas visuais e narrativas, além de outros pequenos elementos que se tornam partes importantes do filme. Infelizmente, ele não fornece o mesmo senso de perigo que nos prendia na maioria dos episódios da série, exceto por alguns vislumbres bem interessantes dos seus melhores momentos – como, por exemplo, em uma cena tensa de confronto que remete diretamente ao faroeste.

Sim, “El Camino” é um filme digno, bem amarrado e respeitoso com o legado de Breaking Bad, especialmente quando dá total razão a uma simples frase dita por Mike (Jonathan Banks) logo no início do filme: “você nunca vai conseguir fazer o certo”. Só faltou um “algo mais” para que pudesse ir além de um quase ‘fan service’... o que é compreensível até certo ponto, pois nós amamos Jesse Pinkman. A mensagem universal dessa franquia ainda pode ressoar por muito tempo, pois todos nós devemos lidar com as consequências dos nossos atos.

Nota: 7

Por Fábio Cavalcanti

Resenha: "HUMBERTO GESSINGER - NÃO VEJO A HORA"



Humberto Gessinger é o tipo de artista que poderia ser citado como um dos veteranos que não tem mais o que provar no rock nacional. Ainda assim, desde o fim dos Engenheiros do Hawaii, o cantor encontrou um novo ritmo de trabalho, e mantém uma carreira solo que junta o seu passado e o seu presente num grande pacote eclético. No seu primeiro álbum solo, “Insular” (2013), ele entregou uma sonoridade sofisticada e indefinida ao mesmo tempo. Já em seu novo álbum, “Não Vejo a Hora” (2019), a ‘vibe’ é de relativa diversão e espontaneidade.

Logo de cara, o ótimo rock “Partiu” nos coloca na “infinita highway” de Gessinger, com alguns ecos de “Até O Fim” (dos Engenheiros), e com um nível de concisão harmônica que dá o tom do disco. Sim, o compositor continua existencialista em suas letras, e não abre mão dos jogos com as palavras e os sentidos, muito menos das referências literárias e musicais em suas temáticas. O diferencial está na parte instrumental, e na forma como ele usa e abusa de dois tipos de power trio: um elétrico, na maioria das canções, e um acústico em outras...

Voltando à estrada dos sons elétricos, temos o razoável pop/rock “Um Dia De Cada Vez”, que parece ter sido feito para ser lançado como um single inofensivo. Pode-se notar mais substância e nuances em “Algum Algoritmo” e “Calmo Em Estolcomo”, que evocam um pouco do Engenheiros do Hawaii mais oitentista.

A vibrante semi-balada “Olhou Pro Lado, Viu” é um dos raros momentos de maior pegada e peso, e ainda oferece alguns toques progressivos. A peculiar e soturna “Outro Nada” é também bastante inspirada, e soa como uma espécie de Blue Öyster Cult influenciado pela milonga. As influências regionais sulistas ainda mostram as caras novamente na boa “Missão”, que puxa algo do estilo do álbum “Gessinger, Licks & Maltz” (1992).

No setor acústico, guiado por violões e acordeom, Gessinger conseguiu o incomum efeito de soar despretensioso em suas incursões de folk regional, como podemos notar nas canções meio irmãs “Fetiche Estranho” e “Estranho Fetiche” – sendo a segunda delas a mais divertida. E “Bem A Fim” é talvez o momento mais bonitinho do disco, com direito a uma letra multifacetada.

“Não Vejo a Hora” é um álbum que consegue soar simples, mas sem perder a típica sofisticação do Humberto Gessinger. Ainda que não traga canções espetaculares, o fato é que todas apresentam algo de bacana nas entrelinhas e nos arranjos, além de uma performance vocal que deixa bem claro o nível de tranquilidade e otimismo em que o artista se encontra. Se ele não via a hora de entregar um álbum mais direto, nós não vemos a hora de ouvir o próximo...

Nota: 8

Por Fábio Cavalcanti

Músicas:
1. Partiu
2. Um Dia De Cada Vez
3. Bem A Fim
4. Algum Algoritmo
5. Calmo Em Estolcomo
6. Olhou Pro Lado, Viu
7. Fetiche Estranho
8. Maioral
9. Estranho Fetiche
10. Outro Nada
11. Missão