10 de janeiro de 2020

Resenha: "1917" (2019) [sem spoilers]



Não é de hoje que os filmes de guerra caíram num lugar-comum, seja pelas exibições de um patriotismo descabido ou pelas épicas contemplações sobre as futilidades da batalha. Recentemente, o controverso “Dunkirk” (de Christopher Nolan) elevou o gênero a um novo patamar de urgência e imersão. E agora, no filme “1917” (2019), o diretor Sam Mendes não apenas se inspira nessa fresca abordagem como a amplifica nos quesitos de intensidade e alma.

A história se passa na Primeira Guerra Mundial, na qual os soldados britânicos Schofield (George MacKay) e Blake (Dean-Charles Chapman) precisam atravessar o território inimigo para levar um aviso sobre uma armadilha a um enorme grupo de soldados. Aqui, a boa e velha “corrida contra o tempo” ganha um ar de proximidade e perigo iminente graças à acertadíssima opção do diretor em idealizar tudo como um longo e angustiante plano-sequência. Muito além do mero exercício de estilo, o roteiro é hábil, bem construído, e equilibrado entre a ação incansável e os quase sombrios momentos de “respiro”.

Os personagens são realistas e estabelecem uma bela simbiose no meio do caos, sendo possível entende-los com o pouco que nos é apresentado. Os jovens soldados interpretados com competência por MacKay e Chapman se destacam em uma provação que parece ter durado anos e anos... numa narrativa que engloba aproximadamente um exaustivo dia. Já os veteranos Colin Firth, Mark Strong e Benedict Cumberbatch fazem papéis menores que se tornam marcantes no sentido de transmitir nas entrelinhas o cansaço e frieza adquiridos após uma longa experiência com a guerra.

Além da excepcional fotografia e da incisiva trilha sonora, as várias cenas de ação podem nos causar arrepios legítimos. Destaco a tensão claustrofóbica de um momento que se passa num abandonado refúgio subterrâneo, os desdobramentos ocorridos em uma cidade destruída que é quase a representação do inferno, e a já memorável sequência na qual um soldado desarmado precisa correr pelo centro de uma batalha em andamento. Daria um capítulo à parte a análise de elementos e até reviravoltas que ficam de fora do nosso campo de visão...

“1917” não é um filme para quem prefere os velhos padrões grandiosos e melodramáticos dos antigos clássicos de guerra. Essa é uma história de abordagem quase íntima, sobre o que mais importa em uma guerra que não leva a humanidade a lugar algum: a mera sobrevivência do indivíduo e de suas memórias, em meio a um horror que é efêmero e cíclico ao mesmo tempo. Sam Mendes não mediu esforços para entregar uma obra que também possa sobreviver ao teste do tempo, e acertou o tiro em cheio!

Nota: 10

Por Fábio Cavalcanti

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